Meu corpo retorce entre estalos e ossos rangendo como se estivessem quebrando-se por debaixo da minha pele, reduzindo, retornando. Os arfares pesados entre dentes afiados tornam-se grunhidos espremidos e contidos por entre meus lábios cada vez mais pálidos. Os pelos alvos e castanhos desfazem-se em fios longos que originaram o viés tão "impuro" de minha forma lupina. Acima de tudo, sorrio com o gosto de sangue humano em minha boca escorrendo entre os caninos agora tão "humanos".

Alguns flashs deslumbram em minha memória enquanto deslizo o dedo em minha face, retomando o sabor de uma gota que escorria em meu queixo, deslizando-o de volta pelo médio. Mal havia dormido, mas não parecia sentir-me cansada, senti aquela dor excruciante, mas até ansiava por mais enquanto o sol já fazia-se presente nas frestas da janela escura. Nua encosto a cabeça na parede, olhando as paredes do quarto fantasiando como uma drogada qualquer sobre a empreitada da caça que fiz. Um indigente não desperta interesse, então não deve ter o menor problema.

Me lavo cuidadosamente e cuido da minha boca para que o cheiro de sangue não fique tão impregnado em mim, principalmente considerando o viés de todas as minhas "companhias" naquele local. Lobos, vampiros, ainda que esteja acostumada a enganar os lupinos neste aspecto por meu próprio olfato também ser apurado, todo cuidado ainda pode ser pouco. Me visto e pego meu wagasa fechado, caminhando até o local onde os outros já deviam estar alimentando-se.

Pelas escadarias aproxima-se aquela mulher que havia me prometido a joia, cuja além do nome, desconhecia qualquer outro detalhe. Ela podia estar até debochando de mim e não saberia, mas, não importava. Era divertido jogar com ela, era o que importava. - Talvez a cama fosse confortável de mais para mim, mas não descansei muito. Talvez estar sozinha também fosse ruim, mas não acho que seria a companhia de meu irmão que teria resolvido as coisas.

Ela remove o tecido dos ombros, alegando sobre o calor, e, inclino-me de lado para observá-la. - Posso tocá-la? Perguntava sem muitos rodeios, curiosa, apesar de já ter visto outros mais à distância. Não esperava exatamente uma resposta, já que levaria a mão ao seu ombro durante a minha fala tocando-a com a ponta dos dedos. - Bem... Falo erguendo meus olhos em sua direção, logo antes de esboçar um sorriso sem tanta confiança. O que eu deveria dizer naquela situação? É mais fácil "manipular" os eventos quando está em seu campo de domínio, e, flertes realmente não era um desses campos.

Havia muita comida e eu não estava com fome, por razões que não entravam em questão, e, também não queria ficar ali por muito tempo. - Me desculpe se eu for indelicada, mas, você come? A pergunta era um tanto peculiar, mas, não havia muito como chegar nesse assunto. - Se não, o que acha de darmos uma volta? Me ofereceria, mas não sei se é muito seguro. Brincaria por último, levantando e ajeitando meu cabelo de forma que meu pescoço ficasse à mostra. Não citava a "opala" em momento algum, não ainda, não poderia ser o foco do diálogo se não correria o risco de perdê-la por ser muito apressada.

Ela tecia um comentário bastante peculiar sobre sua própria pele, afirmando sobre pensar nesta como uma fina porcelana. Fria, bela, alva, de fato era comparação que poderia ser feita se não pelo toque e macio de suas formas suaves, preservas pelo tempo por sua imortalidade. Ela parecia incomodada, entretanto, algo que eu era boa em perceber para que conseguisse usar ao meu favor, apesar de não enxergar um método claro na situação presente.

Ela aparentemente relaxa quando cita sobre sua dieta ser baseada sobre líquidos. Em vez de rir imediatamente, arqueio minha sobrancelha encarando seus olhos fixamente como se a sondasse um breve instante antes de levar meus lábios até quase uma gargalhada, apesar de não tão barulhenta. - Um belo senso de humor se me permite. Ao invés de porcelana, diria que é mais para uma seda refrescante.

Ela fala sobre o sol e sobre sua ausência de afinidade tão reconhecida pelas lendas e histórias, mesmo para alguém como eu sem tanto contato com os hematófagos. - Certamente compreendo... Digo sorrindo ao abrir a wagasa sobre meus ombros. - Em outra oportunidade, façamos a noite também, assim estaremos em nossos melhores habitats. Apesar de, bem... Não acho que as mordidas de uma pequena loba lhe seriam perigosas certo? Brinco mostrando as presas deslizando a língua sutilmente em sua ponta.

O tempo não está muito ensolarado, apesar de ainda manter meu item sombreando meus passos, e, ela desenvolve a conversa de forma peculiar perguntando sobre mim. - Sua curiosidade me lisonjeia. Digo olhando-a de canto, pensando sobre o que deveria falar. - Impura, é como as pessoas me chamam. Já deve ter notado por si as minhas estranhezas, olhos, cabelos, bem, para mim não havia lugar e as pessoas sempre temem o desconhecido. Apesar de neste caso, talvez ser válido temer. - Resumindo, estive sobrevivendo e Callum também cuida de mim.

Giro a haste entre meus dedos virando-me em sua direção. Caminhando, sua altura superava um pouco a minha isto me fazia olhá-la um pouco abaixo. - Ontem comentei sobre as joias e as elogiei na senhorita, mas, dentre os rubis que carrega, seus olhos são os mais brilhantes. Não acho que haja uma "velha alma" aí dentro. Uma velha alma não ficaria curiosa por minha aparência peculiar, ou, talvez por coisa nenhuma? Apesar de minhas palavras, é claro, sabia que ela podia apenas considerar uma garota soltando devaneios. Além disso, aos poucos ia tomando seus trejeitos e sua forma de falar, creditando ser a melhor forma de manter a rota fluindo.

Ela comenta sobre minha aparência e sobre Callum, sendo este segundo tópico mais pertinente. Ela afirmava sobre ele ser cavaleiro de armadura, mas, realmente não consigo imaginar assim, quase é risível o vislumbre do homem sobre um cavalo branco, uma espada nobre e uma armadura prateada. Em minha opinião ele era mais como um mercenário, de fato, acolhendo outros de mesma função para sua família. De trapos para trapos, mas tentando ser algo mais do que a sua natureza, era como enxegava o homem Beowuf.

Esconder as naturezas, certamente era algo que eu fazia. Se havia muito reconhecimento em demais coisas, nesta éramos bastante divergentes já que minhas circunstâncias deixavam o conhecimento limitado sobre mim mais propício na maioria dos casos. - Ora, se quiseres me contar, ficaria feliz em ouvir. Dizem que alguns de vocês viveram por dezenas de milhares de anos, é realmente fascinante.

Uma nova fala trás uma nova particularidade que eu não conhecia sobre eles, informada por ela ao dizer que não respirava. - Eu não sabia sobre isso. Bem, realmente é uma pena que não possam arfar. Na verdade, não respirar impede isso também? A pergunta tinha um viés duplo que, em nenhuma direção era positiva, mas certamente era pior pelas razões que eu havia perguntado. Se eu caçasse um vampiro, não haveria o som da respiração? O pavor estampado nos arfares quentes em meio ao ar gélido noturno? Então de que adianta caçá-los, qual a graça viram meus antepassados?

Meus estranhos pensamentos são interrompidos por sua aproximação, seu toque por uma mecha dos meus cabelos desperta uma sensação bastante peculiar. - Bem, não me atentei tanto de todo modo à chuva. Seu cheiro me era mais interessante durante a caminhada, é realmente algo... Esfrego a ponta dos dedos buscando uma palavra que possa definir. - Não sei bem como definir, mas definitivamente beira o irresistível. O cheiro de sangue.

A sensação de sua proximidade e da carícia era semelhante ao que senti na noite que antecedeu, mas, diferente. Despertava inquietação e desejo, mas não uma sede de um viés puramente cruel, talvez mantendo-se um pouco do egoísmo do desejo de vê-la sentir intensamente algo causado por mim. Não o pânico nos olhos daquele indigente, algo mais. - Você disse antes, as "Opalas" certo? Mas como são? E, por quê acredita que elas seriam mais adequadas para mim?

Belladona era uma senhorita consideravelmente alta, apesar de não parecer no dia anterior por nossas companhias. Estico meu braço para tocar minhas unhas sutilmente em sua face ao observá-la um pouco inquieta, principalmente sobre os assuntos de sua quase vida vampírica. Deveria evitar o assunto? Ou instigá-lo ainda mais? - Você sente sede de sangue quando estamos próximas assim? Ou talvez outro desejo? Talvez não pelo viés lupino em mim? Meus olhos procuram os seus em uma curiosidade insaciável que me mantém na direção em que segue atualmente o nosso diálogo.

Ela parecia triste ao falar sobre sua idade. Limitava-se pelo que deveria ou não, demonstrando ter uma índole bastante contida, gentil, contradizendo parte de sua origem. Entre uma vampira bondosa e uma licantropa apática, o que nos resta? Talvez um humano honesto? Ela respondia sobre a possibilidade de arfar ou não, mas, envolvia sua própria intenção de fazer ou não, mantendo minha desafeição à este aspecto. Se não posso causar tal por minhas ações forçadamente, é menos interessante, e, causar por manipulação também parece um tanto estranho e não natural como aprecio.

Não havia tanta reação sobre o que disse sobre o seu cheiro, nem medo, nem interesse, instingando-me no jogo que eu mesma busco manter. Ela respondia entretanto com mais entusiasmo sobre a Opala. Ela enfatizava seu tom mais pálido em uma paráfrase aos meus próprios traços físicos, alegando que da forma certa conseguia ver mais tons. - E agrada a senhorita? Pergunto em confirmação apesar de ela ter tecido elogios antes, mais específico considerando a conversa mais próxima que decorre-se.

Sinto seu toque em minha mão e um sorriso psicótico aparece por um momento tênue, logo controlado em algo mais singelo, ambos frutos de um interesse caótico e singular. Dor? Prazer? Êxtase? O que ela sente? É melhor do que o que eu sinto? É possível interagirmos dessa forma? - Vá em frente, algumas gotas não devem fazer-lhe mal. Curiosidades não devem ser contidas, certo? Adoraria ser a sua primeira nisso e assistir. Não havia mentira de fato nesta afirmação. Queria observá-la, queria ver ela bebendo meu sangue e queria ver a sua expressão quando fizesse isso.

Ela fala sobre pensamentos adiantados me fazendo ficar um pouco na dúvida, afinal, meus principais desejos acabavam de manifestar-se. Do que ela diz? Há algo mais? Entre lembranças e dúvidas abro meus lábios em surpresa, e então, interesse. - Bem, assim seríamos ambas as primeiras da outra em alguma coisa? Brinco sobre o que ela diz sem negar que quanto à este assunto, também avançaria sem problema alguma. Se seu toque era como a seda, e seu cheiro como o sangue, qual seria o seu sabor?

Apesar dos elogios, não parecia que ela estava totalmente interessada em meu sangue, não o suficiente para correr alguns riscos pelo menos. Minha feição não esconde minha frustração, não precisava depois de mostrar o furor de antes. Deslizo-a por seu rosto antes de colocar meu polegar entre meus lábios. O que dá-se ali é um pequeno furo feito por minhas presas e uma gota de sangue sobre minha língua. - Meu sangue não parece tão ruim assim, mas tudo bem. Dou de ombros.

Seu sorriso e suas palavras não condizem, e, de certa forma me deixam em dúvida sobre como prosseguir a sua conversa. - Se vai me dispensar não seria melhor não ter esse sorriso malicioso em seu rosto? Pergunto provocando, deslizando nos lábios o dedo aberto que deixa um sutil rastro de sangue, neste que já vai curando-se ao longo do percurso marcado de rubro. - Ora, falando em joias, citando-as assim a todo momento me deixa ansiosa para vê-las. Espero que ela seja ajustável... Sorrio esboçando certa timidez. - Não que esteja cobrando algo ou coisa do tipo, só lamentaria muito se a loba em mim tomasse forma inesperadamente e acabasse quebrando um presente que a senhorita me deu.

Ela comenta sobre o tempo me fazendo olhar os arredores sutilmente. - Eu lamentaria. Será que ficaria com cheiro de cachorro molhado? Isso seria uma lástima depois de tudo. Sorrio ao fazer a piada, apesar de dentre todos os campos lábia e atuação, o humor certamente não ser um dos meus melhores artifícios. O sorriso entretanto se desfaz em certo ciúmes quando ela diz sobre a sirena, anseando por seu sangue e confirmando que meu vislumbre anterior estava correto.

- Foi uma vergonha certo? Eu quase desmaiar daquele jeito mesmo sendo parcialmente uma licantropa. Blefo sobre o anterior, brincando com palavras aqui e ali ainda na esperança de encorajá-la sobre o assunto anterior. Olho para ela, sondo como minhas palavras podem ou não gerar problemas futuros, principalmente se aos ouvidos de Callum uma omissão soar como uma mentira desagradável. - Bem, vou confiar um pouco na senhorita. Não, não fiquei, apenas o sol que antecedeu a tempestade e toda aquela caminhada me deixou um tanto fraca. Minha pele como pode ver não é muito amigável ao sol, quando caminho sobre este é como se estivesse constantemente sentindo dor e constantemente me regenerando. Perto de outras dores mais cativantes, essa é massiva, estressante, sua fraca intensidade e longa constância me irrita um pouco.

Talvez aquela fosse a primeira vez que falava abertamente sobre uma de minhas fraquezas, uma real. De certa forma isto tornava verdade que ela tinha sido minha primeira em algo, apesar de eu não me sentir assim para ela. Deveria eu assumir o que disse sobre minha aparência de igual maneira, já que ambas eram coisas levianas? Não parecia tão interessante. - Ao contrário, sou muito curiosa sobre muitas coisas. Sei o sabor de um humano, sei o sabor de uma sirena, sei o de um lobo, mas dentre os dois que eu ainda não sei certamente há um que me deixa mais curiosa. Levo lentamente a mão em direção a sua, erguendo seu braço vagarosamente na direção de meu rosto. Replico a malícia de sua feição ao mostrar minhas presas. - Mas é claro, diferente das demais sensações, esta faria apenas com a sua autorização...

Pelo que parecia, não haveria nenhuma ação no momento ali, tampouco as joias já que ela informou-me sobre a necessidade de espera. Meus dedos erguem a wagasa, se fosse mais alta e esta fosse maior, talvez cobriria também a dama, mas, não era o caso. Não havia motivos para deixá-la baixa mais aparentemente, também, retendo-a em meu ombro para proteger-me do mormaço. Ela dizia sobre nossos hábitos em comum, e, me pergunto até onde eles vão? Talvez suas piadas na prévia daquele evento me soaram equivocadamente? Ou ela ainda escondia algo debaixo de suas facetas tão comportadas assim como eu? Talvez um voto? Ou talvez eu só não fosse interessante o suficiente.

Ela falava sobre sua pele ser tóxica para mim, mas, eu realmente não via da mesma forma para este caso. - Bem, é um fato que meu sangue é perigoso para ti, mas a tua carne não é para mim. Sabe, assim como minha pele regenera-se inquietamente sobre o sol, não morreria por algum tipo de intoxicação alimentar, na verdade, acho até que fomos feitos para devorá-los, visto este desejo tão peculiar que surge em mim, diferente, de alguma forma, de minhas demais caçadas. Sorrio sem tanta força, mas, as poucos retomando as facetas de minha máscara em uma pose mais respeitosa e positiva, afastando meu toque de seu braço. - Então nossa diferença real são onze anos, ao menos a física... Bem, como disse não vou fazer nada à senhorita que não seja autorizada. Apesar de não apreciar de fato "me comportar", estou acostumada à conter meus impulsos.

Sua feição parecia triste em meio à isto, haveria rubor certamente se fosse possível, mas ao invés disso havia uma mão estendida em minha direção. O que deveria fazer? Concordar? Insistir? Era raro encontrar-me em dúvidas sobre as minhas decisões e também não queria perder a joia. Eu me contentaria com pouco? Deveria tentar beijá-la? Forçar de certa forma essa experimentação do sangue e sentir ainda um pouco do teu gosto? Não, não acredita que tenha a destreza necessária para sequer usar isso como algum viés de ganho.

Meus olhos passeiam por seus lábios alguns momentos em hesitação e dúvida, ainda sem erguer as mãos. Por fim, cubro meus lábios inferiores pelo superiores deslizando meus dentes por cima da pele e um pouco de saliva. Limpo o sangue que está ali quase seco, cuja presença sequer teve algum impacto. Puxando até que esteja limpo ao deslizar a minha língua por fim ergo a minha mão em direção a sua. - Beijaria sua mão agora em cumprimento, mas, aí acho que seria difícil cumprir com as minhas palavras de só morder com consentimento.

Dou alguns passos adiante passando-a em nossa sutil caminhada, mirando meus olhos agora na paisagem que nos cerca. - Acho que gostaria de conhecer Vollbrecht em algum momento, Viktor também parece um indivíduo muito singular. Comento observando-a de canto por um breve momento, ponderando que ambos haviam oferecido presentes em joias. - Opalas e Rubis, aparentemente vampiros também apreciam bastante as joias. Ambas ainda feitas pela mão da senhorita, não poderia estar mais feliz. Neste ponto minha atuação já estabilizava-se por completo em um largo sorriso, mesmo que esta não fosse tão realmente a sensação.